13/01/2025

O ser humano tem uma grande e antiga relação com o mar, porém, por muitos séculos era comum achar que o oceano e os mares fossem capazes de processar todo o tipo de resíduos sólidos neles lançado e que os mares eram fontes inesgotáveis de recursos. O resultado dessa negligência, é que atualmente os mares e oceanos estão sofrendo os impactos das atividades humanas e estão sob grave ameaça.

O lixo é uma das maiores ameaças aos mares e oceanos. Mas, o que é lixo nos mares?

“É qualquer tipo de resíduo sólido produzido pelo ser humano, gerado em terra ou no mar, que, intencionalmente ou não, tenha sido introduzido no ambiente marinho, incluindo o transporte desses materiais por meio de rios, drenagens, sistemas de esgoto ou vento, excluindose os materiais orgânicos (como restos de alimento e vegetais) (IOUSP, 2020).

“Lixo nos mares é todo resíduo sólido processado, utilizado e descartado pelo ser humano, que entra no ambiente marinho” (IOUSP, 2020).

A maior parte dos resíduos encontrados no mar é composta por produtos de plástico, o que está relacionado à sua vasta utilização pela sociedade pós‐moderna, sua durabilidade, sua flutuabilidade, e principalmente, pelo descarte inadequado dos resíduos sólidos urbanos.

Dentre os materiais encontrados no mar, que são originados a partir de diversas atividades humanas, temos: papel, tecidos (sintéticos ou não), madeira, metal, plásticos, vidro, borracha, misturas de materiais e filtros de cigarro.

Borracha, madeira e vidro possuem um tempo de degradação muito longo, podendo ser indeterminado para a borracha e o vidro. Esses materiais podem flutuar, dispersando‐se por grandes distâncias e carregando organismos em suas superfícies, introduzindo espécies em locais onde elas não ocorrem naturalmente. A madeira pintada e a borracha ainda podem conter substâncias tóxicas ao ambiente marinho.

Os itens plásticos, tecidos sintéticos e misturas com outros materiais possuem grande durabilidade, o que faz com que permaneçam flutuando no ambiente marinho por longos períodos de tempo. As conhecidas “ilhas de lixo” no meio do oceano são, na verdade, regiões de acúmulo de resíduos, na sua maioria plásticos. Já, quando se fragmentam, os plásticos geram partículas cada vez menores, chamadas de “microplásticos”, que podem ser ingeridas por diversos organismos. Microplásticos são praticamente impossíveis de serem retirados da água dos mares e oceanos e sua geração deve ser combatida com muito rigor.

Outros resíduos com composições mais densas que a água do mar afundam nos arredores das áreas onde são gerados.

A enorme quantidade de resíduos, poluentes e contaminantes nos mares e oceanos causa, além de danos estéticos, danos à saúde e à qualidade ambiental, à biodiversidade, impactos econômicos e à saúde e segurança do ser humano.

Os resíduos sólidos nos mares podem provocar sérios impactos e ameaças: resíduos flutuantes podem causar danos econômicos e de segurança às embarcações. Resíduos que afundam na coluna d’água podem se depositar no fundo ou ficar presos em recifes de corais e costões rochosos, causando danos físicos e ecológicos aos habitats. Se o resíduo for um petrecho de pesca (fragmento de rede, corda, linha, armadilhas etc.), pode causar o emaranhamento de animais, levando‐os à morte. Resíduos sólidos presentes em paisagens naturais comprometem seus valores estéticos e, consequentemente, as atividades de turismo e lazer. A “pesca fantasma”, provocada por petrechos de pesca abandonados, perdidos ou descartados inadequadamente nos mares, além de causar danos ambientais graves, também afeta o setor de pesca, quando redes e outros artefatos capturam peixes e outros organismos de interesse comercial. Resíduos hospitalares, pilhas e baterias, embalagens de substâncias químicas perigosas, latas e fragmentos de vidro são exemplos de resíduos que provocam danos graves à saúde e segurança humana, por serem perfurocortantes, contaminantes ou tóxicos. Além disso, assim como os animais, pescadores, marinheiros, banhistas, surfistas e mergulhadores podem emaranhar‐se em redes de pesca e outros artefatos que estejam flutuando na água ou presos ao fundo, levando ao risco de afogamento. A ingestão de resíduos por animais marinhos pode causar sérios danos. Após a ingestão, os resíduos sólidos podem obstruir o trato digestório, levando à falsa sensação de saciedade e, consequentemente, à desnutrição e à morte por inanição. Também podem ocorrer lesões e infecções no trato digestório se o resíduo ingerido for pontiagudo ou áspero, causando a morte do animal.

Animais marinhos de interesse comercial, que são especialmente consumidos por inteiro (incluindo o trato gastrointestinal) pelos humanos, como mexilhões e ostras, podem ser um potencial vetor de transferência de itens plásticos e eventuais poluentes que os mesmos possam ter adsorvido. Apesar da possibilidade dessa via de contaminação para o ser humano, sua magnitude, abrangência e potenciais efeitos ainda são desconhecidos. (IOUSP, 2020)

Todas as ações e atividades humanas, em terra ou no mar, são fontes potenciais de resíduos sólidos para os mares e oceanos. Portanto, é fundamental a destinação adequada dos resíduos sólidos. Regiões vulneráveis, onde falta saneamento básico, são as que mais geram resíduos sólidos para os mares e oceanos. Quando os resíduos adentram o ambiente marinho, são levados por correntes e se acumulam em inúmeros locais, como áreas costeiras, praias, recifes de coral, manguezais, ilhas, giros oceânicos e mar profundo. Assim, o acúmulo de resíduos sólidos nos mares e oceanos é um problema global, grave e de responsabilidade compartilhada entre as nações e os diversos setores da sociedade. São diversos os impactos do lixo nos mares: no turismo, na segurança alimentar, na saúde, na navegação, na pesca e aquicultura, no bem-estar animal e na biodiversidade. Portanto, é necessário que ações sejam realizadas nos níveis global, nacional, regional e local, envolvendo o poder público, os cidadãos, a academia, as organizações da sociedade civil e o setor privado.

O lixo é apenas um dos problemas que afetam a qualidade dos mares e oceanos. Uma série de poluentes não visíveis, porém com sérias consequências ao meio ambiente e à saúde humana, também está presente. Alguns exemplos são: matéria orgânica, gerada pelo lançamento irregular de esgoto das cidades; fertilizantes, agrotóxicos e pesticidas agrícolas, que são levados pelos rios ao mar; resíduos de medicamentos e hormônios liberados na urina para o esgoto, como antibióticos, anti-inflamatórios, antidepressivos e anticoncepcionais; poluentes orgânicos, como o petróleo cru, hidrocarbonetos resultantes da queima de combustíveis; detergentes; compostos tóxicos presentes em tintas anti-incrustantes, utilizadas nos cascos de embarcações para evitar o crescimento de organismos; e metais pesados, oriundos de atividades industriais. Além disso, outras ações, como a supressão de manguezais e dragagens para o aprofundamento do canal de navegação de portos, podem causar erosão e aumentar a turbidez da coluna d’água, diminuindo a disponibilidade de luz e a produtividade primária.

No mar, isso leva à formação de zonas mortas (sem vida), à proliferação de algas produtoras de toxinas, as conhecidas marés vermelhas, ou à disseminação de microrganismos patogênicos.

Essa situação começou a preocupar cientistas, governos e sociedade, o que incentivou uma série de ações internacionais e nacionais, com o objetivo de compreender a dimensão dos danos causados por essa poluição à vida marinha, aos ecossistemas e às atividades humanas e procurar soluções para minimizar esses impactos.

 

Confira a seguir uma síntese das iniciativas internacionais e nacionais, que buscam a qualidade ambiental do oceano, bem como solucionar o impacto dos resíduos sólidos no ambiente marinho:

1972 Convenção de Londres – Convenção sobre Prevenção da Poluição Marinha por Alijamento de Resíduos e Outras Matérias (regula o despejo de resíduos e outras substâncias potencialmente prejudiciais ao meio marinho.)
1973 MARPOL – Convenção Internacional para a Prevenção da Poluição por Navios (estabelece limites geográficos para a deposição de diferentes resíduos por embarcações no mar.)
1974 Programa Mares Regionais (resultados da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, realizada pela ONU, em 1972. Estabelece a colaboração entre países vizinhos para combater a degradação marinha.)
1982 CNUDM – Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar (Estabelece os direitos do mar, com definições e regras sobre o uso do ambiente marinho e seus recursos. Destaca a prevenção, redução e controle da poluição marinha de origem terrestre.)
1988 Anexo V – MARPOL (Trata da poluição por resíduos sólidos, proibindo o lançamento ao mar de qualquer tipo de resíduo plástico gerado nas embarcações.)
1988 Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro
1995 GPA (Programa de Ação Global para a Proteção do Ambiente Marinho de Atividades Terrestres. Entende que as atividades realizadas em terra podem gerar impactos ao oceano, por meio da conexão criada pelas bacias hidrográficas.)
1998 Lei de Crimes Ambientais
2000 Lei de Combate à Poluição em águas Jurisdicionais Brasileiras
2005 Política Nacional para os Recursos do Mar
2010 Política Nacional de Resíduos Sólidos
2011 Compromisso DE Honolulu (Pactua a intenção de diversos grupos de combater o problema dos resíduos nos mares.) e Estratégia de Honolulu (Instrumento de gestão para reduzir os impactos causados pelos resíduos sólidos de fontes terrestres e marinhas.)
2015 Conferência sobre Microplástico (Discute a cadeia de valor do plástico e as formas de reduzir essa poluição no ambiente marinho – OSPAR E Holanda)
2017 Conferência dos Oceanos (Amplia a discussão do ODS 14 e sua internalização nos países, por meio da proposição de mais de 1600 Compromissos Voluntários.)
Plano de Ação sobre Lixo Marinho (Estabelece, através de uma Rede Global
Comprometida ‐ RGC, políticas de prevenção de poluição marinha por resíduos sólidos.)
2019 Plano Nacional de Combate ao Lixo no Mar
2021‐2030 Década das Ciências Oceânicas para o Desenvolvimento Sustentável – UNESCO (Impulsiona programas científicos para melhorar o gerenciamento dos recursos oceânicos e das zonas costeiras.)
2021 Plano Estratégico de Monitoramento e Avaliação do Lixo no Mar do Estado de São Paulo (PEMALM)

Síntese elaborada com base na figura 6.1 e no Quadro 6.2 do livro: Lixo nos Mares: do entendimento à solução. São Paulo, IOUSP, 2020.

A presença de resíduos sólidos e poluentes nos mares é um indicador da forma insustentável como a sociedade tem vivido. Sendo assim, é urgente sensibilizá-la e mobilizá‐la em prol de ações para a conservação do oceano.

 

Saiba como você pode contribuir no enfrentamento ao lixo nos mares:

  • Tenha hábitos de consumo consciente, dando preferência a produtos biodegradáveis e que não sejam tóxicos. Leia sempre a embalagem antes de adquirir qualquer coisa. Não adquira produtos de uso único e descartáveis, como canudos, copos e talheres plásticos. Use sacolas retornáveis em suas compras.
  • Contribua para a coleta seletiva e a logística reversa dos materiais.
  • Jamais jogue lixo no chão da rua ou no vaso sanitário.
  • Quando for à praia, não jogue lixo na areia ou no mar. Não queime, nem enterre o seu refugo. Leve todo o seu lixo de volta com você, para descartá-lo de forma adequada. Se você estiver em um navio, barco ou em uma ilha, embale o lixo e leve-o para as lixeiras no continente. Nunca descarte lixo no mar.
  • Antes de entrar na água do mar, procure saber se seu protetor solar é fabricado com produtos atóxicos (não tóxicos) e biodegradáveis.
  • Quando você for pescar, nunca deixe a linha ou a rede de pesca esquecida na água. Ao pescar, junte os restos de peixes, iscas, pedaços de linhas e redes, embale e coloque na lixeira adequada.
  • Jamais despeje combustível no mar. Verifique sempre o estado da sua embarcação. Além disso, todo cuidado é pouco para evitar derramamento de combustível ao abastecer uma embarcação. Restos de combustível lançados ao mar, além de poluir a água, matam a fauna e prejudicam a pesca.
  • Não remova pedras e conchas do local. Respeite a biodiversidade marinha local.
  • Denuncie casos de pesca predatória; pesca em épocas ou locais proibidos de acordo com o órgão ambiental competente; pesca de espécies que devam ser preservadas ou espécimes com tamanhos não permitidos pelo órgão competente.
  • Participe de mutirões e campanhas em prol do meio ambiente, fazendo, por exemplo, o recolhimento de resíduos das praias e fazendo a destinação adequada.
  • Outra forma da sociedade civil atuar, frente ao problema dos resíduos no ambiente marinho, é auxiliando em atividades de monitoramento, em ações conhecidas como ciência cidadã, e exercendo a fiscalização, dentro da lógica do controle social. Algumas ações de controle social, como o maior engajamento da sociedade com a problemática do lixo, a demanda por melhorias no saneamento básico, assim como a participação da própria sociedade no monitoramento dos resíduos (ciência cidadã), podem ajudar a reduzir a entrada destes no ambiente marinho.

 

Saiba mais:

Plano Nacional de Combate ao Lixo no Mar. Disponível em: https://semil.sp.gov.br/educacaoambiental/prateleira-ambiental/plano-nacional-de-combate-ao-lixo-no-mar-agenda-nacional-de-qualidade-ambiental-urbana-fase-1/

Plano Estratégico de Monitoramento e Avaliação do Lixo no Mar do Estado de São Paulo. Disponível em:  https://semil.sp.gov.br/educacaoambiental/prateleira-ambiental/plano-estadual-de-monitoramento-e-avaliacao-do-lixo-no-mar-pemalm-de-sao-paulo/

Lixo nos Mares: do Entendimento à Solução: Disponível em: https://semil.sp.gov.br/educacaoambiental/prateleira-ambiental/lixo-nos-mares-do-entendimento-a-solucao/

Objetivos de Desenvolvimento Sustentável – ODS 14 – Vida na água: Conservar e usar de forma sustentável os oceanos, mares e os recursos marinhos para o desenvolvimento sustentável. Disponível em: https://brasil.un.org/pt-br/sdgs/14

A Década da Ciência Oceânica – Brasil. Disponível em: https://decada.ciencianomar.mctic.gov.br/sobre-a-decada/

 

 

 

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Texto: Denise Scabin – CEA/SEMIL

Gestão de conteúdo, planejamento e arte: Cibele Aguirre – CEA/ SEMIL

 

 

Referências

 São Paulo. Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo. Lixo nos Mares: do entendimento à solução. São Paulo, 2020.
São Paulo: SMA. Pesca Sustentável. Denise Scabin Pereira; Érica de Siqueira Mendes Agassi; Iris
Regina Fernandes Poffo; Regina Brito Ferreira. São Paulo, 2013.