02/06/2025

Francisco Gutiérrez e Cruz Prado, do Instituto Latino-americano de Pedagogia da Comunicação (ILPEC), da Costa Rica, criaram o conceito de “ecopedagogia”, em seu livro “Ecopedagogia e cidadania planetária” (GUTIÉRREZ & PRADO, 1998). Para eles a Ecopedagogia promove a aprendizagem do “sentido das coisas a partir da vida cotidiana”.

Para o Professor Moacir Gadotti:

“O desenvolvimento sustentável tem um componente educativo formidável: a preservação do meio ambiente depende de uma consciência ecológica e a formação da consciência depende da educação. É aqui que entra em cena a ecopedagogia. Ela é uma pedagogia para a promoção da aprendizagem do sentido das coisas a partir da vida cotidiana. Encontramos o sentido ao caminhar, vivenciando o contexto e o processo de abrir novos caminhos; não apenas observando o caminho. É, por isso, uma pedagogia democrática e solidária. Paulo Freire pode ser considerado um dos inspiradores da ecopedagogia com o seu método de aprendizagem a partir do cotidiano.

A ecopedagogia é um conceito em construção, que está se desenvolvendo, seja como um movimento pedagógico, seja como abordagem curricular. Ela pode ser entendida como um movimento social e político. Pode, também, implicar uma reorientação dos currículos, para que incorporem os princípios defendidos por ela, e influenciar a estrutura e o funcionamento dos sistemas de ensino. A ecopedagogia preza, ainda, pela valorização da diversidade cultural.

“… a ecopedagogia não é uma pedagogia a mais, ao lado de outras pedagogias. Ela só tem sentido como projeto alternativo global onde a preocupação não está apenas na preservação da natureza (Ecologia Natural) ou no impacto das sociedades humanas sobre os ambientes naturais (Ecologia Social), mas num novo modelo de civilização sustentável do ponto de vista ecológico (Ecologia Integral) que implica uma mudança nas estruturas econômicas, sociais e culturais. Ela está ligada, portanto, a um projeto utópico: mudar as relações humanas, sociais e ambientais que temos hoje. Aqui está o sentido profundo da Ecopedagogia, ou de uma Pedagogia da Terra, como a chamamos.” (in: Pedagogia da Terra – ideias para um debate”, Moacir Gadotti, Portugal, 2000).

Segundo Gadotti, são princípios da ecopedagogia:

  1. O planeta como uma única comunidade.
  2. ATerra como mãe, organismo vivo e em evolução.
  3. Uma nova consciência que sabe o que é sustentável, apropriado, o faz sentido para a nossa existência.
  4. A ternura para com essa casa. Nosso endereço é a Terra.
  5. A justiça sócio-cósmica: a Terra é um grande pobre, o maior de todos os pobres.
  6. Uma pedagogia biófila (que promove a vida): envolver-se, comunicar-se, compartilhar, problematizar, relacionar-se entusiasmar-se.
  7. Uma concepção do conhecimento que admite só ser integral quando compartilhado.
  8. O caminhar com sentido (vida cotidiana).
  9. Uma racionalidade intuitiva e comunicativa: afetiva, não instrumental.
  10. Novas atitudes: reeducar o olhar, o coração.
  11. Cultura da sustentabilidade: ecoformação. Ampliar nosso ponto de vista.

Todas as pedagogias clássicas são antropocêntricas (antropocentrismo é a teoria segundo a qual o ser humano é o centro do Universo). Já, a ecopedagogia parte de uma consciência planetária. Ela supera o antropocentrismo das pedagogias tradicionais e concebe o ser humano em sua diversidade e em relação com a complexidade da natureza. A Terra passa a ser considerada também como ser vivo. Por isso, a ecopedagogia pode ser chamada de “Pedagogia da Terra” (GADOTTI, 2001).

Segundo Francisco Gutiérrez, a ecopedagogia não é uma pedagogia escolar. Ela não é voltada apenas para os educadores, mas para os habitantes da Terra em geral, para todos os cidadãos. A ecopedagogia insere-se, também, num movimento recente de renovação educacional, que inclui a transdisciplinaridade e o holismo (abordagem ou conceito que busca entender os fenômenos de uma maneira integral).

Para Gadotti, a ecopedagogia é uma nova pedagogia dos direitos, que associa os direitos dos humanos aos direitos da Terra.

Segundo Gadotti, a ecopedagogia não se opõe à Educação Ambiental. Pelo contrário, amplia seu campo de reflexão e ação. Para a ecopedagogia, a educação ambiental é um pressuposto. A ecopedagogia incorpora-a e oferece estratégias, propostas e meios para a sua realização concreta. Gadotti explica que a ecopedagogia não se preocupa apenas com uma relação saudável com o meio ambiente, mas com o sentido mais profundo do que fazemos com nossa existência, a partir da vida cotidiana.

A ecopedagogia seria, portanto, uma educação para a cidadania planetária. O Professor Gadotti trabalha com conceitos como consciência planetária e cidadania planetária, defendendo uma revolução pedagógica e curricular, que defende a formação de cidadãos do mundo, que pertençam não a uma nação ou a um grupo étnico, mas ao mundo, à humanidade.

Para a ecopedagogia, é fundamental cultivar uma cultura da sustentabilidade e da paz, para que as pessoas passem a ver a Terra como ser vivo, como lar a ser cuidado e não usado e predado e as sociedades sejam mais cooperativas e menos competitivas. Para a ecopedagogia, tudo o que é feito à Terra tem reflexos nos seres humanos, pois somos parte da Terra e, portanto, ao destruir a Terra, os seres humanos estão se autodestruindo. Para a ecopedagogia, deve haver desenvolvimento com justiça e equidade; e a sustentabilidade deve ser um princípio interdisciplinar reorientador da educação. A ecopedagogia desenvolve uma cidadania planetária, ou seja, o ser humano pertence a uma única comunidade e o planeta Terra é um ser vivo com quem devemos ter uma relação equilibrada e saudável. A ecopedagogia não se dirige apenas aos educadores, mas, a todos os cidadãos do planeta, promovendo uma educação sustentável. A ecopedagogia tem como objetivo reeducar o olhar das pessoas, para evitar agressões ao meio ambiente. Nesse sentido, a Ecopedagogia ou a Pedagogia da Terra, pode dar uma enorme contribuição para Educação Ambiental

 

Saiba mais:

Conheça a Carta da Ecopedagogia, retirada do livro de: GADOTTI, Moacir. Pedagogia da terra: Ecopedagogia e educação sustentável. Editor: CLACSO, Consejo Latinoamericano de Ciencias Sociales, 2001.

Carta da ecopedagogia

Em defesa de uma pedagogia da Terra

(Minuta de discussão – Movimento pela ecopedagogia)

  1. Nossa Mãe Terra é um organismo vivo e em evolução. O que for feito a ela repercutirá em todos os seus filhos. Ela requer de nós uma consciência e uma cidadania planetárias, isto é, o reconhecimento de que somos parte da Terra e de que podemos perecer com a sua destruição ou podemos viver com ela em harmonia, participando do seu devir.
  2. A mudança do paradigma economicista é condição necessária para estabelecer um desenvolvimento com justiça e equidade. Para ser sustentável, o desenvolvimento precisa ser economicamente factível, ecologicamente apropriado, socialmente justo, includente, culturalmente equitativo, respeitoso e sem discriminação. O bem-estar não pode ser só social; deve ser também sóciocósmico.
  3. A sustentabilidade econômica e a preservação do meio ambiente dependem também de uma consciência ecológica e esta da educação. A sustentabilidade deve ser um princípio interdisciplinar reorientador da educação, do planejamento escolar, dos sistemas de ensino e dos projetos político-pedagógicos da escola. Os objetivos e conteúdos curriculares devem ser significativos para o(a) educando(a) e também para a saúde do planeta.
  4. A ecopedagogia, fundada na consciência de que pertencemos a uma única comunidade da vida, desenvolve a solidariedade e a cidadania planetárias. A cidadania planetária supõe o reconhecimento e a prática da planetaridade, isto é, tratar o planeta como um ser vivo e inteligente. A planetaridade deve levar-nos a sentir e viver nossa cotidianidade em conexão com o universo e em relação harmônica consigo, com os outros seres do planeta e com a natureza, considerando seus elementos e dinâmica. Trata-se de uma opção de vida por uma relação saudável e equilibrada com o contexto, consigo mesmo, com os outros, com o ambiente mais próximo e com os demais ambientes.
  5. A partir da problemática ambiental vivida cotidianamente pelas pessoas nos grupos e espaços de convivência e na busca humana da felicidade, processase a consciência ecológica e opera-se a mudança de mentalidade. A vida cotidiana é o lugar do sentido da pedagogia pois a condição humana passa inexoravelmente por ela. A ecopedagogia implica numa mudança radical de mentalidade em relação à qualidade de vida e ao meio ambiente, que está diretamente ligada ao tipo de convivência que mantemos com nós mesmos, com os outros e com a natureza.
  6. A ecopedagogia não se dirige apenas aos educadores, mas a todos os cidadãos do planeta. Ela está ligada ao projeto utópico de mudança nas relações humanas, sociais e ambientais, promovendo a educação sustentável (ecoeducação) e ambiental com base no pensamento crítico e inovador, em seus modos formal, não formal e informal, tendo como propósito a formação de cidadãos com consciência local e planetária que valorizem a autodeterminação dos povos e a soberania das nações.
  7. As exigências da sociedade planetária devem ser trabalhadas pedagogicamente a partir da vida cotidiana, da subjetividade, isto é, a partir das necessidades e interesses das pessoas. Educar para a cidadania planetária supõe o desenvolvimento de novas capacidades, tais como: sentir, intuir, vibrar emocionalmente; imaginar, inventar, criar e recriar; relacionar e interconectar-se, auto-organizar-se; informar-se, comunicar-se, expressar-se; localizar, processar e utilizar a imensa informação da aldeia global; buscar causas e prever consequências; criticar, avaliar, sistematizar e tomar decisões. Essas capacidades devem levar as pessoas a pensar e agir processualmente, em totalidade e transdisciplinarmente.
  8. A ecopedagogia tem por finalidade reeducar o olhar das pessoas, isto é, desenvolver a atitude de observar e evitar a presença de agressões ao meio ambiente e aos viventes e o desperdício, a poluição sonora, visual, a poluição da água e do ar, etc. para intervir no mundo no sentido de reeducar o habitante do planeta e reverter a cultura do descartável. Experiências cotidianas aparentemente insignificantes, como uma corrente de ar, um sopro de respiração, a água da manhã na face, fundamentam as relações consigo mesmo e com o mundo. A tomada de consciência dessa realidade é profundamente formadora. O meio ambiente forma tanto quanto ele é formado ou deformado. Precisamos de uma ecoformação para recuperarmos a consciência dessas experiências cotidianas. Na ânsia de dominar o mundo, elas correm o risco de desaparecer do nosso campo de consciência, se a relação que nos liga a ele for apenas uma relação de uso.
  9. Uma educação para a cidadania planetária tem por finalidade a construção de uma cultura da sustentabilidade, isto é, uma biocultura, uma cultura da vida, da convivência harmônica entre os seres humanos e entre estes e a natureza. A cultura da sustentabilidade deve nos levar a saber selecionar o que é realmente sustentável em nossas vidas, em contato com a vida dos outros. Só assim seremos cúmplices nos processos de promoção da vida e caminharemos com sentido. Caminhar com sentido significa dar sentido ao que fazemos, compartilhar sentidos, impregnar de sentido as práticas da vida cotidiana e compreender o sem sentido de muitas outras práticas que aberta ou solapadamente tratam de imporse e sobrepor-se a nossas vidas cotidianamente.
  10. A ecopedagogia propõe uma nova forma de governabilidade diante da ingovernabilidade do gigantismo dos sistemas de ensino, propondo a descentralização e uma racionalidade baseadas na ação comunicativa, na gestão democrática, na autonomia, na participação, na ética e na diversidade cultural. Entendida dessa forma, a ecopedagogia se apresenta como uma nova pedagogia dos direitos que associa direitos humanos -econômicos, culturais, políticos e ambientais- e direitos planetários, impulsionando o resgate da cultura e da sabedoria popular. Ela desenvolve a capacidade de deslumbramento e de reverência diante da complexidade do mundo e a vinculação amorosa com a Terra.

 

 

 

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Texto: Denise Scabin – DEA/SEMIL
Gestão de conteúdo, planejamento e arte: Cibele Aguirre – DEA/ SEMIL

 

 

 

 

 

Referências

 GADOTTI, Moacir. Ecopedagogia, Pedagogia da terra, Pedagogia da Sustentabilidade, Educação Ambiental e Educação para a Cidadania Planetária – Conceitos e expressões diferentes e interconectados por um projeto comum. 2009. Este documento faz parte do acervo do Centro de Referência Paulo Freire. (acervo.paulofreire.org) Disponível em: https://acervo.paulofreire.org/items/3f737051-1289-4a5c-aa6d-8ae88a3c7ad6

GADOTTI, Moacir. Pedagogia da terra: Ecopedagogia e educação sustentável. Editor: CLACSO, Consejo Latinoamericano de Ciencias Sociales, 2001. Disponível em: http://biblioteca.clacso.edu.ar/clacso/gt/20101010031842/4gadotti.pdf