24/02/2022

Para auxiliar a Baixada Santista na elaboração de seu Plano Regional de Resiliência e Adaptação Climática, a Cooperação Alemã para o Desenvolvimento Sustentável (GIZ) contratou um estudo com análises de projeções climáticas para a região. O trabalho faz parte do Projeto Municípios Paulistas Resilientes (PMPR) da Secretaria de Infraestrutura e Meio Ambiente (SIMA) do Estado de São Paulo. O Relatório Final das Análises Climáticas para a Baixada Santista Considerando Dados Observados e Modelagem do Clima Futuro, divulgado nessa quinta-feira (24) em um evento virtual, utiliza como referência os dados de temperatura e precipitação registrados entre 1976 e 2005, comparando-os com os resultados do conjunto de projeções de 20 modelos climáticos para os períodos 2021-2050; 2051-2080 e 2081-2100.

“Para auxiliar os trabalhos que se iniciam em 16 de março, o Estado vai capacitar os técnicos e técnicas das 9 cidades a manusear os dados e identificar as vulnerabilidades para estabelecer as iniciativas e metas na Baixada Santista. Como resultado teremos o Plano Regional de Resiliência e Adaptação Climática, uma iniciativa pioneira no país”, disse a diretora da Assessoria Internacional da SIMA, Jussara Carvalho.

“Os impactos da mudança do clima desconhecem as fronteiras dos municípios, das regiões, estados e países. Para aumentar a resiliência do território, é preciso conciliar e integrar os esforços dos diferentes níveis de governo para o desenvolvimento desta estratégia regional da Baixada Santista” complementou a diretora de projetos da GIZ, Ana Carolina Câmara.

Para realizar as análises climáticas, o estudo dividiu a Baixada Santista em três compartimentos territoriais diferentes: porção Sul, Central-Serra e Central-Planície, levando em consideração alguns padrões climáticos observados pelos dados históricos.

“Precisamos entender a realidade dos dados e informações para trabalhar de forma efetiva. O Projeto na região vai ajudar na concepção e a estabelecer as ações necessária para definir as políticas públicas desse desafio intersetorial que reflete no meio ambiente, saúde, habitação entre outros”, destacou na abertura do evento, o diretor-adjunto da Agência Metropolitana da Baixada Santista, Márcio Quedinho.

O estudo apresentado pelo responsável técnico, cientista Pedro Ivo Camarinha, se baseou na em métodos sugeridos pelo estado-da-arte da ciência do clima, no conhecimento dos especialistas, além de técnicas inovadoras que foram incorporadas em ambiente de programação. Um dos avanços, é que foram feitas análises estatísticas robustas considerando todo o conjunto de dados obtido pelos 20 modelos climáticos. Além disso, foram feitas análises exclusivas para o período chuvoso, compreendido entre os meses de outubro a março, e seco, compreendido entre abril a setembro, o que traz mais clareza a respeito dos diferentes impactos da mudança do clima quando comparado com estudos que avaliam apenas os dados anuais.

“Mesmo com avanço desta análise climática, ainda é recomendável estudos mais aprofundados e continuados por toda a Baixada Santista, sobretudo a respeito de como as mudanças do clima detectadas poderão amplificar os risco climáticos já existentes, além de permitir o melhor direcionamento de medidas de planos de adaptação e redução de risco, tais como as chamadas ações de adaptação baseada em ecossistema (AbE), ações de educação ambiental, normativas e leis de uso e ocupação, além da capacitação e suporte à Defesa Civil dos municípios”, destacou Camarinha.

Dentre os resultados obtidos, destaca-se a alta possibilidade de valores extremos de temperatura ocorrerem na porção Sul, caracterizando ondas de calor mais frequentes e severas, especialmente após 2050.

No que se refere aos eventos extremos de chuva, os resultados sugerem que estes poderão se tornar mais frequentes nas regiões de maiores altitudes, especialmente aquelas nas proximidades das encostas da Serra do Mar em Cubatão, Santos, São Vicente e Guarujá, que já recebem os eventos de precipitação mais elevados historicamente.

Para estimar os níveis de incerteza contidos de cada alegação a respeito das mudanças do clima, foi utilizada uma matriz de referência baseada em i) no nível de concordância dos 20 modelos climáticos utilizados ao indicar tal tendência e ii) o nível de magnitude da evidência detectada; que classifica as previsões com níveis de confiabilidade muito baixa, baixa, média, alta e muito alta.

De acordo com as análises, as chuvas podem aumentar tanto em magnitude quanto em frequência já nas próximas décadas e muito provavelmente se acentuarão ainda mais na segunda metade do século. Esses fenômenos poderão causar mais eventos de inundações bruscas, enxurradas, alagamentos, processos erosivos e deslizamentos de terra; especialmente nas regiões de serra e logo abaixo delas.

Os resultados das análises indicaram um aumento de pelo menos +1ºC na média das temperaturas máximas e mínimas até 2050 (confiabilidade muito alta), especialmente no verão, que poderá ter ondas de calor mais severas e cerca de cinco vezes mais frequentes.

Além disso, o estudo indica que quanto mais extremo for um evento já registrado historicamente, maior será o aumento relativo de sua frequência. Por exemplo, até 2050, eventos com tempo de recorrência de 15 a 10 anos tendem a acontecer pelo menos a cada 5 anos (alta confiabilidade).

As previsões apontam que os eventos recordes de precipitação em 1, 3 ou 5 dias tendem a ser quebrados com mais frequência. As chuvas mais brandas de menor intensidade, que são historicamente mais frequentes, passarão a acontecer um pouco menos que o normal.

Nos dois períodos analisados (chuvoso e seco), sobretudo nos meses de transição, é provável que ocorram mais veranicos e estiagens, os quais também tendem a ser mais severos, o que eventualmente pode causar situações de déficit hídrico significativo, pois períodos de baixa precipitação devem coincidir com períodos de elevadas temperaturas e elevada evapotranspiração da floresta.

Durante o “período seco”, as anomalias de temperaturas abaixo da média por muitos dias consecutivos vão ser tornar mais raras até 2050, sendo que, após esta data, é virtualmente certo que a região não tenha mais eventos desse tipo se as trajetórias de emissões globais de gases de efeito estufa seguirem no mesmo ritmo acelerado em que estão.

A contratação do estudo faz parte do ProAdapta – Apoio ao Brasil na Implantação da sua Agenda Nacional de Adaptação à Mudança do Clima, uma parceria entre o Ministério do Meio Ambiente do Brasil (MMA) e o Ministério Federal do Meio Ambiente, Proteção da Natureza e Segurança Nuclear da Alemanha (BMU, sigla em alemão).

Sobre o estudo

O estudo dividiu o território da Baixada Santista em três compartimentos, Sul, Central-Serra e Central-Planície, baseados na variabilidade espacial de alguns indicadores climáticos como temperatura e precipitação. A análise utilizou dados observados do período entre 1976 e 2005 como referência comparativa em relação aos resultados obtidos para os períodos de 2021-2050; 2051-2080; 2081-2100. Embora seja uma região pequena do ponto de vista climatológico, a divisão foi necessária por possuir alguns contrastes bem definidos devido às suas características geográficas e ambientais.

A metodologia aplicada foi capaz de identificar os principais sinais climáticos esperados para as próximas décadas contemplando uma análise de indicadores, utilizando multimodelos regionalizados (20 no total) e cientificamente validados, respeitando as incertezas associadas.

O documento também discute, de forma indireta, possíveis mudanças relacionadas às descargas elétricas, que é um outro tipo de risco climático presente na região, sugerindo poderá haver uma maior incidência destas conforme o aquecimento global se torna realidade. Teoricamente, uma maior quantidade de eventos extremos de chuva está atrelada também à uma ocorrência maior de tempestades, normalmente acompanhadas de descargas elétricas nesta região, sobretudo nos meses mais quentes do ano.

Porção Sul: localizada entre os municípios de Peruíbe, Mongaguá e Itanhaém (com exceção de sua parte alta), foi verificado que essa é a região mais quente no período de referência (1976-2005) e que também será a com maiores valores absolutos de temperatura nos períodos futuros (alta confiabilidade). De todos os resultados, o mais preocupante se refere às ondas de calor, durante o verão, que são classificadas como eventos de temperatura bem acima do normal e com permanência de pelo menos seis dias consecutivos. Dependendo da trajetória de emissões de gases de efeito estufa nas próximas décadas, é muito provável que estas ondas de calor se tornem até 10 vezes mais frequentes entre 2050-2080, o que significaria algo entre 2 e 3 ondas de calor por verão.

Há também evidências significativas a respeito do aumento da frequência e duração das “ondas de calor” durante o período seco, principalmente no inverno, assim como da duração dos dias consecutivos sem chuva. Estes dois fatores combinados, estiagem com altas temperaturas, podem acarretar diversos tipos de impactos para a saúde humana, nos recursos hídricos e nos ecossistemas em geral.

Classificados também como alegações de alta confiabilidade, são esperados mais dias com extremos de temperatura, já nas próximas décadas (2021-2050), onde a média das temperaturas máximas ao longo da estação podem ultrapassar os 30 ºC em alguns anos, juntamente com dias de calor extremo ultrapassando máximas de 38 ºC.

No que se refere aos eventos extremos de chuva potencialmente deflagradores de deslizamentos de terra generalizados (acima de 220 mm em 72h), chama a atenção o encurtamento do período de ocorrências que, muito provavelmente, será de um evento a cada 3 anos, ao invés de a cada 5-6 anos.

Os altos índices pluviométricos observados nas partes mais altas da Serra do Mar e o cenário de intensificação das chuvas pode fazer com que eventos de grande magnitude se manifestem mais frequentemente nas áreas à montante, se propagando rapidamente para as áreas mais baixas com alto potencial de impacto, demandando especial atenção por parte do poder público.

Porção Central-Serrana: é caracterizado por toda parte serrana e de altitudes elevadas, que vai desde Mongaguá, Praia Grande e São Vicente, passando por Cubatão, metade da parte continental de Santos até a divisa entre Bertioga e São Sebastião.

Sua principal característica histórica se refere aos elevados índices de chuva. Essa é uma característica natural do clima da região, sendo que as projeções do clima futuro indicam que todos estes padrões se intensificarão ainda mais nas próximas décadas (alta confiabilidade). Esta constatação evidencia a necessidade de um planejamento antecipado a estas mudanças do clima, uma vez que podem determinar no aumento significativo de diversos riscos climáticos associados e que estão presentes historicamente pelo território desta porção da Baixada. Neste sentido, destaca-se o potencial aumento considerável de deslizamentos de terra, especialmente em eventos com ocorrências generalizadas e com alto potencial de impacto (confiabilidade muito alta), assim como inundações bruscas, enxurradas e alagamentos (alta confiabilidade).

Todo este cenário demonstra ainda mais a importância da conservação da Mata Atlântica em toda a Baixada, especialmente na porção serrana e de maiores altitudes.

No que se refere aos resultados da temperatura, não há grandes discrepâncias entre o que foi observado nas demais regiões. Há um padrão evidente de aumento das temperaturas médias, mínimas e máximas que provavelmente acompanharam as tendências de aumento da temperatura média global.

As análises para esta porção também sugerem que há a possibilidade significativa das estiagens aumentarem nos períodos de transição (começo do outono e final da primavera), e que estes poderão ser acompanhados de dias com temperaturas bem mais elevadas que o normal, o que aumentaria a evapotranspiração da mata nativa das encostas da Serra do Mar, diminuindo a disponibilidade hídrica, impactando a fauna e flora, sobretudo os ecossistemas mais frágeis como por exemplo os manguezais.

Porção Central-costeira: essa porção compreende a planície costeira que vai de Praia Grande até Bertioga. Os resultados sugerem incrementos significativos na mesma proporção que a região serrana no que se refere às chuvas mais intensas (alta confiabilidade).

Em complementação a este sinal climático, os resultados indicam que o aumento na intensidade e severidade dos eventos de precipitação muito provavelmente será maior na segunda metade do século.

Importante ressaltar que, devido à proximidade das porções costeiras e serranas, algumas localidades desta porção costeira tendem a ser mais impactadas pelos eventos extremos de chuva que ocorrem nas porções de serra e em altitudes mais elevadas, pois também são influenciadas pelo efeito orográfico.

Dentre os diversos riscos climáticos nesta porção da Baixada Santista, destacam-se aqueles associados à processos geo-hidrológicos (deslizamentos de terra, intensificação de processos erosivos, solapamento, carreamento de sedimentos, enxurradas, alagamentos, inundações bruscas, etc.), tanto pelos impactos múltiplos que podem ser causados à população, mas também em diversas infraestruturas críticas presentes na região (portos, gasodutos, oleodutos). Considerando o complexo mosaico da paisagem e de interações socioecológicas nesta porção da Baixada Santista, reitera-se a atenção especial que deve ser dada a este tipo de risco climático, considerando essas potencialidades em planejamentos territoriais, zoneamentos ecológicos e econômicos.

Os resultados obtidos a partir das projeções do clima futuro indicam que a tendência de praticamente todos os índices de temperatura é muito semelhante às demais regiões da Baixada Santista, já mencionados anteriormente. De todos os índices avaliados, aquele que mais se destaca dos padrões e valores observados nas outras duas porções avaliadas, são as ondas de calor. Mesmo que a média de temperatura seja a mais baixa entre as demais regiões, os resultados sugerem que é muito provável que as ondas de calor aumentem significativamente nesta porção da Baixada em comparação com as demais. Ou seja, elas aconteceriam mais frequentemente e seriam mais longas que nas demais regiões, porém com uma intensidade menor (alta confiabilidade).

Para se ter um parâmetro comparativa, no período de referência (1976-2005), para a estação chuvosa, os dados observados indicam que essas ondas de calor aconteciam cerca de 1 vez a cada 6 anos, sendo que os modelos são contundentes ao indicar que este número aumentaria cerca de 10 vezes até 2050, chegando a uma frequência de aproximadamente 2 vezes a cada estação chuvosa ou 1 vez a cada 3 meses (alta confiabilidade).

Para acessar o estudo completo, clique aqui: Relatório FINAL – Baixada Santista – out_2021_Completo 23.02