
15/08/2018
O segundo dia do EPBio, realizado na quinta-feira, 9 de agosto, teve início com uma palestra sobre Uso sustentável da vegetação como estratégia para conservação dos recursos naturais. Antes a vegetação era um obstáculo ao desenvolvimento econômico, o que criava sérios embates com os ambientalistas. A solução encontrada é usar a vegetação de maneira estratégica para garantir sua conservação.
Renato Nunes, do Centro de Desenvolvimento Tecnológico (CDT/CBRN/SMA), propõe uma nova regulamentação sobre exploração de vegetação nativa no Estado de São Paulo, com delimitação da vegetação nativa no Cadastro Ambiental Rural (CAR); criação da Área de Uso Alternativo do Solo (AUAS); delimitação da Área de Reflorestamento; menos burocracia para plantio e exploração; recomposição da Reserva Legal com retorno financeiro; maior segurança jurídica para o desenvolvimento das atividades tradicionais sustentáveis por povos e comunidades tradicionais e pequenos produtores, transição para uma agricultura sustentável (Protocolo de Transição Agroecológica), fortalecimento da cultura da diversidade (biológica e cultural); estímulo ao plantio e a regeneração da vegetação nativa em pequenas e grandes propriedades com diferentes estratégias; integração da agroecologia, uso da vegetação nativa e de atividades tradicionais na formação dos extensionistas; promoção da Segurança e Soberania Alimentar e Nutricional; e resiliência às mudanças climáticas.
Uso sustentável
O uso sustentável da biodiversidade é apontado como a resposta para conservar a vegetação e se beneficiar os serviços ambientais. O professor Tiago Francoy, da USP, chamou a atenção para o fato de que a destruição do meio ambiente põe em risco de extinção plantas, animais e pessoas. E os custos dessas perdas são altíssimos, ultrapassa a casa de bilhões de dólares por ano. Neste contexto, o que mais chama a atenção é a polinização com as abelhas. Estima-se que 73% das espécies vegetais cultivadas no planeta sejam polinizadas por abelhas, 19% por moscas, 6,5% por morcegos, 5% por vespas, 5% por besouros, 4% por pássaros e 4% por borboletas e mariposas.
Francoy explica que os benefícios da polinização se traduzem em frutos maiores e mais pesados, maior reserva nutricional das sementes, amadurecimento mais uniforme, maior quantidade de frutos e sementes produzidos, aumento do teor de óleo em sementes, aumento do poder germinativo das sementes e aumento da variabilidade genética das populações. E as abelhas são as maiores responsáveis por isso.
Ainda segundo informações do professor, estima-se que o Brasil abrigue cerca de três mil espécies de abelhas. E o estado de São Paulo mil delas, sendo conhecidas 729 espécies desses polinizadores. O destaque é para a Tribo Meliponini, abelhas sem ferrão, com cerca de 350 espécies em território nacional e responsável por até 90% da polinização de plantas e flores. “É urgente e necessário um marco regulatório da meliponicultura para o estado paulista”, reforçou.
Alternativas competitivas
Helena Carrascosa, coordenadora do Programa Nascentes, apresentou outro projeto, o Florestas Plantadas Multifuncionais, que tem plantio de mudas ou semeadura, em que as árvores plantadas constituem mais de 50% dos indivíduos maduros.
De acordo com Helena, a floresta plantada pode e deve ser usada como alternativa econômica, para recompor reserva legal e para serviços ecossistêmicos. “A floresta precisa ser desejada e pode ter diversos usos. Queremos que as pessoas usem a biodiversidade para ter biodiversidade”.
Áreas com vocação florestal que foram desmatadas, pastagem de baixa produtividade, regiões com baixos indicadores socioeconômicos e áreas não mecanizáveis com cana-de-açúcar podem ser convertidas em floresta multifuncionais. Com isso, o resultado esperado é a restauração de 300 mil hectares de vegetação nativa, a geração de 104 mil postos de trabalho em atividades de restauração, redução da erosão e assoreamento, evitando a perda de até cinco milhões de toneladas de solo por ano, 60 milhões de toneladas de carbono sequestrada em 25 anos e taxa interna de retorno média de 14,37%.
Sociobiodiversidade e agroecologia
A última mesa debateu a Sociobiodiversidade – o papel das comunidades tradicionais da agricultura familiar, da agroecologia e da agricultura urbana para conservação da biodiversidade, a promoção da agrobiodiversidade, o fortalecimento da soberania e segurança alimentar para o resgate das culturas alimentares.
Três moradores de comunidades tradicionais foram convidados para contar sobre sua vivência. Ana Carolina Santana Barbosa, do Fórum de Comunidades Tradicionais Indígenas, Quilombolas e Caiçaras de Angra dos Reis, Paraty e Ubatuba (FTC), Marcos dos Santos Tupã (FTC e Comissão Guarani Yvyrupá) e Antonio Benedito Jorge (Comunidade Quilombola Pedro Cubas). Os relatos apontam a necessidade de falar de políticas públicas para as comunidades tradicionais para que não sejam criminalizadas e nem sejam vítimas de interesses imobiliários e náuticos, por exemplo, resolver a questão da territorialidade dessas comunidades e maior entendimento sobre a cultura desses povos.
Bons resultados
Neide Araújo, responsável pela Unidade de Subprojetos Ambientais do Programa de Desenvolvimento Rural Sustentável (PDRS), apresentou os resultados da implantação de Sistemas Agroflorestais (SAF) no estado paulista: 607 famílias em 600 hectares. “Queríamos atividades produtivas sustentáveis, a ruptura dos paradigmas da agricultura tradicional, da monocultura, com uso intensivo de recursos e agroquímicos. E queríamos ganhos ambientais e sociais”, explicou.
A geração de trabalho e renda, o estímulo à participação dos jovens no campo, o fortalecimento da equipe CBRN (linguagem e metodologia para agricultor familiar, gestão, SAF) e de parcerias e o incentivo a regulamentação foram alguns dos resultados alcançados com a implantação do projeto.
O encerramento do décimo EPBio foi regado a música. A cantora, instrumentista e pesquisadora da música tradicional brasileira Renata Mattar contou um pouco da história das canções tradicionais criadas por trabalhadores rurais que cantam durante o trabalho, como a bata do feijão e do milho, por exemplo, e de diversos lugares do Brasil. A ideia, segundo ela, é manter viva a tradição, além de ser um reconhecimento dessa cultura e de suas comunidades.
Texto: Luciana Reis
Fotos: José Jorge/Pedro Calado/Dirceu Rodrigues
Revisão: Cris Leite